O desfecho das eleições de 2022 repete as promessas feitas durante as privatizações dos anos 90. Embora com contextos de natureza bem distinta, o papel a que se prestou a esquerda nesses dois momentos está ligado a uma só gestão da crise do capitalismo dependente brasileiro: o petucanismo. O pacto com a classe dominante no pós-Ditadura se deu, segundo Theotônio dos Santos, pelo temor norte-americano pelo nacionalismo militar dos últimos presidentes do regime ditatorial. Pela natureza do pacto e pelas circunstâncias da política externa naquele momento, a redemocratização, ao contrário do que tenta demonstrar a narrativa petista, se deu muito mais “de cima para baixo” que o contrário. No entanto, a aliança não estancou a onda de protestos e manifestações que reuniu amplos setores sociais e fecundou movimentos populares de imensa importância na Constituição Federal, dos urbanos aos indigenistas.
Sabe-se que, mesmo com a maciça presença desses setores, a Constituição foi insuficiente e diferencialmente respeitada, sendo os parágrafos redigidos pela classe que comprou o golpe de 1964 muito mais respeitados que os parágrafos dedicados aos setores populares. O que importa é que, naquele momento, a esquerda passava por um profundo processo de reestruturação. O retorno do exílio de suas figuras, as eleições de 1982 e a ascensão das discussões em torno da Constituinte, reacendendo debates reformistas do campo progressista, atiçou a esperança de alguns. No entanto, já nas eleições de 1988, a esquerda começa a centralizar o que viria a ser seu incondicional apoio ao líder sindical Lula, embora fosse o único candidato que, segundo pesquisas eleitorais da época, não conseguiria vencer Fernando Collor num eventual 2° turno. Esse apoio vai figurar no acúmulo de pactos e promessas do então sindicalista, mesmo que custasse o sacrifício de suas bandeiras mais combativas.
De lá para cá, todo o diagnóstico foi fartamente discutido pela Revolução Brasileira: do Plano Real às concessões da digestão moral da pobreza. Das privatizações à galopante entrega das riquezas nacionais. Antes mesmo de Lula assumir, o assalto ao Estado imposto pelo Plano Real de Fernando Henrique Cardoso impossibilitava, mesmo no campo progressista, uma candidatura que enfrentasse a ordem rentística vigente e, ao mesmo tempo, investisse os recursos necessários aos direitos sociais e civis discutidos uma década antes. Dissemos em 2020, na ocasião do lançamento da pré-candidatura do camarada Heitor Silva à vereança na cidade do Rio de Janeiro:
A manutenção da lógica da acumulação rentística exigiu durante esse período um firme compromisso com a austeridade fiscal, que deita raízes sobre a chamada “Lei de Responsabilidade Fiscal”. Desde 2000, a lei estrangulou as contas dos estados e municípios, e a população acompanhou um acelerado processo de sucateamento da prestação de serviços de saúde, educação, transporte e segurança, cujo objetivo foi, e segue sendo, a privatização das empresas estatais do setor de serviços, tendo como exemplo mais emblemático, em nível nacional, a entrega a baixo custo de nossas empresas de ponta na área de tecnologia e extração de recursos naturais, como a Petrobrás e a Embraer, e, em âmbito regional, o processo de privatização da Cedae. Isso significa que o atual modelo de acumulação de riqueza dos capitalistas, ancorado no mecanismo da dívida pública, limita de maneira drástica a capacidade de atuação das prefeituras.
Da derrota para Collor à vitória em 2002 na chapa com o empresário da Coteminas, José de Alencar, uma das principais bases para a afirmação da hegemonia lulista no plano da esquerda ou, como chamam os petistas, da “disputa democrático-popular”, foram, justamente, as alianças regionais e locais. Foram precisamente estas que pariram as figuras mais medíocres, corruptas e sintomáticas de um contexto tão despolitizante e entregue ao eleitoralismo que abraça desde os empresários do transporte público às narcomilícias: Washington Quaquá, Sérgio Cabral, Marcelo Crivella, Luiz Fernando Pezão… Eduardo Paes! Paes é uma semente das “maçãs podres” do antigo PDT, para seguir a alegoria de Brizola, que cresceu, germinou e suas raízes apodrecidas encontraram sombra e água fresca com o perfil de aliança regional que o petismo figurava no estado fluminense. Só ver no caso de Maricá, com Washington Quaquá desafiando, a cada dia, os ingênuos que negam a proximidade entre Lula e Bolsonaro. É nesse cenário que, em 2009, é eleito, pela primeira vez, Eduardo Paes, do então PMDB.
Paes e a cidade da burguesia
A gestão Paes, que durou longos 8 anos em sua fase inicial, liquida com qualquer ilusão, ingenuidade ou até cumplicidade na condução do debate canalha e infrutífero se Paes seria uma figura conservadora, de centro ou até de esquerda. O mais alienado cientista político padrão Globo News traria bons argumentos de que se trata de uma clássica figura da direita. É só analisar seus próprios discursos (ver https://oglobo.globo.com/rio/em-campanha-paes-tenta-vincular-sua-imagem-as-transformacoes-feitas-por-pereira-passos-5433676). Esse erro não é perdoável por parte da esquerda, supostamente estudiosa da História, que se esquece da figura com quem Paes se compara: Pereira Passos. O mesmo prefeito que submeteu o Rio de Janeiro a um brutal processo de contrarreforma urbana no início do século XX, conhecida como “Reforma Passos”, de caráter conservador, responsável pela demolição de mais de 2 mil casas somente ao longo da faixa onde fora construída a atual Avenida Rio Branco, além da dinamitação de morros (como o de Santo Antônio) e dezenas de cortiços, promovendo uma massiva expulsão da classe trabalhadora do Centro e o direcionamento do crescimento da cidade das elites para a Zona Sul. A comparação, embora anacrônica, é justa para um prefeito que, como Pereira Passos, reprime ambulantes, moradores de rua e promove planos urbanísticos de caráter higienista com forte respaldo na especulação da terra urbana.
Assim, o gerente da burguesia Paes, como sua distinta e orgulhosa comparação, promoveu suntuosos planos urbanísticos, que atravessaram seus primeiros dois mandatos à reboque da Copa de 2014 e das Olimpíadas de 2016 e impulsionam a segregação sócio-espacial da classe trabalhadora. Mais de 14 bilhões de reais foram injetados só de infraestrutura com dinheiro público para as Olimpíadas, o que inclui VLT, BRT, Porto Maravilha e Linha 4 do Metrô. O tal “legado olímpico” encareceu e pouco integrou a cidade e sobretudo a periferia ao centro, além do fato de que pelo menos 580 famílias foram removidas da noite para o dia da Vila Autódromo, atual Parque Olímpico, e outras quase 2 mil famílias para os casos do BRT, do Porto Maravilha e da reforma no Maracanã. O VLT opera com eficiência quase zero e sua capacidade de integração, além de esdrúxula, atropelou importantes vestígios de cemitérios de escravos no cais do Valongo. Os BRTs não passam de uma medida paliativa – mais um exemplo de entrega à iniciativa privada às custas do endividamento do estado e sucateamento: convivem com superlotações e estão distantes do plano original de construção de um metrô de superfície. Somente nos primeiros 39 quilômetros da linha Transcarioca foram gastos quase 2 bilhões de reais, ou seja, 50 milhões a cada quilômetro, quando o normal é que o quilômetro de asfalto custe em torno de 500 mil reais. Por outro lado, o Porto Maravilha, projeto de seu 2º governo, só no último relatório trimestral de 2023 chegou aos 10,2% de Certificados de Potencial Adicional Construtivo (CEPACs) consumidos, muito abaixo das expectativas de investimento. Somado a isso, várias denúncias e lutas do Movimento Unido dos Camelôs (Muca) contra a repressão de Paes aos ambulantes e a icônica repressão à greve dos professores por reajuste salarial em 2013, caracterizaram os 2 primeiros mandatos do principal aliado de Lula na cidade do Rio de Janeiro após sucessivas derrotas do impotente Marcelo Freixo. O custo de vida aumentou, os níveis de desemprego cresceram e a violência urbana viu suas estatísticas crescerem.
No entanto, o “balcão de negócios” não se restringe às políticas de habitação e transporte. Um dos casos mais emblemáticos na nossa cidade é a substituição dos serviços oferecidos diretamente pela prefeitura por serviços desempenhados por Organizações Sociais (OS), principalmente no caso da saúde, algo que Haddad já vinha fazendo em São Paulo. Na prática, as OSs concedem ao capital privado mais participação em serviços como o Sistema Único de Saúde, o que abre brechas para parcerias público-privadas e terceirização em hospitais públicos, clínicas populares, Instituto do Câncer, etc. É a entrega de mais um serviço público essencial nas mãos dos empresários que anseiam negociar a vida da população.
Por outro lado, na segurança, a herança de Cabral foi continuada, com as Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), que tanto Marielle Franco denunciou, e que culminou, nesses últimos 4 anos, em 3 das 4 maiores chacinas policiais da história da cidade. Como não esquecer, ainda, o apoio de Paes às milícias “polícia mineira” de Jacarepaguá? A mesma área em que o prefeito estampava sua relação política próxima á família Brazão, suspeita de envolvimento com o assassinato de Marielle Franco. A distopia é tal que sua irmã, a ministra Anielle Franco, está sendo cotada para ser vice-prefeita do mesmo Eduardo Paes. Na prática, o perfil de alianças do Rio de Janeiro é da esquerda com seus algozes e assassinos diretos, condizente com o crescimento da atuação desses grupos criminosos, que se veem, agora, em associação com o narcotráfico na Zona Oeste.
Nas eleições de 2020, Paes é reeleito para seu 3° mandato na prefeitura do Rio, dessa vez pelo PSD, e contando com um apoio enrustido da esquerda liberal sob o bordão “nenhum voto no Crivella”, e não mais o antigo “Paes é Crivella, Crivella é Paes”. O principal plano urbanístico: Reviver Centro, que conta não mais com as tradicionais famílias da construção civil, mas agentes financeiros do capital estrangeiro, com apoio, diferentemente do Porto Maravilha, de amplos setores da esquerda liberal, sobretudo do PT. O Reviver, como o Porto, preconiza a desterritorialização da classe trabalhadora para um novo processo de acumulação de capital no Centro, que agora conta com novos empreendimentos e o leilão de históricos edifícios, como o A Noite. A implementação, aliás, é bem semelhante entre os dois: a prefeitura compra o terreno urbano e cede à iniciativa privada, que por sua vez especula para gerar valorização. Somado a isso, os estudos técnicos de implementação não são divulgados pela prefeitura. O resultado não podia ser diferente: investimentos abaixo do esperado e encarecimento do aluguel, funcionando como um prolongamento do custo de vida e da demanda da Zona Sul, área valorizada da cidade, para o Centro, ao invés da incorporação dos subúrbios ao Centro. Não à toa, desde que o prefeito inacreditavelmente pôs uma enquete de Twitter para “avaliar” quem seriam os interessados em morar no Centro, as respostas eram provenientes do perímetro urbano mais valorizado da metrópole. Por trás dessas ações, o discurso ideológico de que o Centro estaria com ocupação de residência, comércio e sede de empresas muito abaixo da capacidade. O que não é falso, mas é utilizado para mascarar o galopante encarecimento do terreno urbano, ao invés de inserir a classe trabalhadora periferizada em seus planos e mais: articular em um amplo debate da Reforma Urbana e a necessidade de desapropriação de solo urbano destinado à especulação.
O “Dudu” é um surfista do identitarismo
Na cidade do Rio de Janeiro as eleições municipais têm por si só uma importância política nacional. O Rio é a segunda maior metrópole do Brasil, com 6,2 milhões de habitantes e a capital da 3ª força estadual no Produto Interno Bruto (PIB) em 2021. Suas contradições internas mesclam peculiaridades locais e antagonismos centrais que dividem toda a sociedade brasileira. Seu papel, que já fora de capital federal a grande pólo industrial, se vê ainda como importante centro turístico, receptor de novos ciclos de expansão do capital financeiro na produção social do espaço urbano e dependente dos royalties de petróleo da exploração mineral norte-fluminense. Não foi diferente no caso de 2020, em que o liberalismo de direita, comandado por Paes, antagonizava-se eleitoralmente com o traficante da fé do povo e pastor, Marcelo Crivella. Uma eleição que poderia despontar, pedagogicamente, como exemplo máximo de disputa de frações da burguesia com o interesse de omitir os reais dramas da nossa sociedade de classes, como ocorreria em 2022, mostrou ser, para a esquerda liberal, uma luta pelas identidades. É nesse contexto que emerge um dos principais canais de afirmação de Paes como aliado da “esquerda” carioca, na medida em que a religião e a pauta conservadora de Crivella deu sobrevida ao identitarismo pelo campo da esquerda e da direita liberais.
De policialesco que bate em professor a simpático sambista que faz dancinha no Tiktok, Paes mostrou todo o seu talento oportunista nas eleições de 2020, buscando a polarização diante do bispo, antigo aliado do Partido dos Trabalhadores e sobrinho de Edir Macedo, Marcelo Crivella. Expressão de uma pequena burguesia conservadora, Crivella, que se territorializa mediante a expansão recente das Igrejas Universais, foi candidato do bolsonarismo. Desde 2016, o prefeito-pastor se aproveitava dos debates ideológicos e pouco relevantes promovidos pela direita conservadora, com o intuito, justamente, de desnortear a esquerda diante de pautas centrais para a classe trabalhadora carioca. Nesse contexto, o liberalismo de esquerda apoia enrustidamente o candidato do PSD, Paes, que se apresenta como o candidato “democrático” e do “diálogo”, incorporando as pautas identitárias em uma espécie de antecipação da frente ampla, a nível municipal. O PT, antes oposição, vira governista, e apoia os projetos de Eduardo Paes sem contestação, em nome do suposto combate ao fantasma do “fascismo”. Logo atrás vieram PSB e PDT, seduzidos pelo oportunismo do suposto candidato “em cima do muro”. A despeito da derrota eleitoral do bispo Crivella, a direita saiu vitoriosa, e a conjuntura de crise é favorável para a reorganização dos conservadores. O resultado é o que se apresenta: o agravamento da luta de classes na capital, e a continuidade da ameaça representada pela direita fascistoide.
A Luta de Classes no Rio de Janeiro
A despeito do recuo do desemprego na capital para 9,3% no 1º semestre de 2023, a menor taxa em seis anos, embora ainda esteja elevada, não traduz os 38% vistos na taxa de informalidade da Região Metropolitana, segundo PNAD Contínua Trimestral, do IBGE. O Rio foi a capital brasileira com o maior nível de informalidade durante a pandemia, e o recente episódio do desprezo de Lula à CLT só pode agravar o cenário de aprofundamento da superexploração do trabalho. Somado a isso, o aumento do custo de vida, que é histórico e relativamente alto numa grande metrópole como o Rio de Janeiro, desde as compras de frutas e hortaliças no mercado ao preço dos combustíveis, faz da classe trabalhadora carioca ainda mais refém da precarização como renda complementar ou mesmo principal.
A pauta tem sido vulgarizada por Lula que, ao invés de discutir o custo de transporte elevado pelo assalto dos rentistas à Petrobras, prefere retomar a estocagem de alimentos. O caso do entorno agrícola do Rio é ainda mais dramático: segundo a Emater-RJ (2019), tomate e alface são as principais hortaliças propagadas por sementes no estado, mais da metade da oferta de folhosas da capital (dados de 2011) é atendida pela Região Serrana e seus preços apenas se elevam. Isso sem mencionar a Reforma Agrária, esquecida pelo MST em nome da adesão ao lulismo! Por outro lado, sobre os grandes monopólios de delivery, em nada têm sido enfrentados pela gestão Paes, que chegou a criar o aplicativo local “Valeu!”, com a promessa de tarifa zero para restaurantes e maior lucro para os motofretistas, quando a iniciativa, rapidamente, foi derrubada, muito provavelmente pelos próprios monopólios. Não chegou a 4 meses!
O desprezo à maior fatia da classe trabalhadora pode ser visto nas medidas paliativas dos pré-desastres ambientais que, além de fortemente enviesadas para os espaços residenciais classemedianos e das elites, condena a população, como no caso dos deslizamentos de massa e alagamento de casas, a exemplo do que ocorreu na Zona Norte e nas favelas cariocas nesta mesma época do ano (março de 2023), no último agosto e o que pode ocorrer nos próximos dias. Embora Crivella tenha sido hostilizado, e com razão, pela infame culpabilização das chuvas pelo “relevo”, Paes segue uma linha de raciocínio parecida, ao terceirizar a responsabilidade para as mudanças climáticas que, como o relevo, exerce influência, mas não explica os desastres. Os desastres apresentam um conteúdo estrutural vinculado à dependência que, com o padrão de urbanização e de exploração imperialista da mão de obra e dos recursos ambientais na periferia capitalista, aloca a classe trabalhadora em áreas de elevado risco, com menor disponibilização de equipamentos urbanos de mitigação e prevenção das tragédias.
O debate da regularização fundiária em sua expressão máxima, a Reforma Urbana, foi olimpicamente abandonada pela esquerda liberal, se pautando pela grande mídia e ignorando a razão maior pela qual os trabalhadores se veem obrigados a ocupar as encostas e os alagados: a especulação imobiliária. O resultado da despolitização se mostra no contentamento com o ponto facultativo para a data prevista para maior precipitação das chuvas, que atinge uma parcela minoritária da população trabalhadora, que está submetida a um regime de superexploração ininterrupto. A visão “ecológica” da classe dominante engloba apenas parte do “meio ambiente”, e o ambiente, aquele em que a sociedade e, por sua vez, a classe trabalhadora vive, em contrapartida, é ideologicamente escamoteado.
Ademais, o aumento nas tarifas do metrô, trem e ônibus no último ano se deu sem resistência. Em atos convocados com total descolamento dos trabalhadores, que apenas assistiam de passagem às falas coordenadas por lideranças estudantis e partidárias, a esquerda liberal, mais uma vez, provou sua posição eleitoreira, distante das demandas das massas. Precisava enfrentar um oneroso saldo de despolitização conferido em 2022 em nome da eleição de Lula, em que o debate da mobilidade urbana, como o da autonomia do Banco Central, desapareceu de cena! Foi fracassado. Ao invés de estender o debate para a universalização do transporte de massas via estatização, o palanque preferiu se conter em falas repetitivas, carregadas dos elementos identitários da “luta” anterior, judicializando a mobilização num abaixo-assinado para a suprema corte da burguesia, o STF, e reduzindo a pauta para um mero Passe Livre, que não nos liberta da dominação do oligopólio dessas concessões e ainda aprofunda o assalto ao Estado promovido pelos repasses. Como produto, não houve adesão das massas, e o turbinamento da morte da memória promovida pelo petismo não tocou nas consequências das nefastas Parcerias Público-Privadas (PPPs) de Cabral e Paes, agora até endossadas por Boulos em São Paulo.
Já não há mais distinção entre inimigos, aliados e companheiros! As greves, como a ocorrida no Sindicato Estadual dos Profissionais de Educação (SEPE), foram analisadas nos programas “Educação Necessária” (ver https://www.youtube.com/live/JPQQaqThyPA?si=b2p8mNkT1_Wjz7Oz e https://www.youtube.com/live/ywkPsNHNoO8?si=hn8-Ew2EonSclMvI), e o mesmo caráter isolado se deu, com imensa derrota política, material e organizativa, para a categoria diante de lideranças incapazes de trazer um conteúdo de enfrentamento às políticas educacionais empresariais de Paes, Castro e Bolsonaro/Lula.
O Rio de Janeiro caminha a passos largos para uma nova polarização eleitoral. Desta vez, o espectro de adesão da esquerda liberal à candidatura do ultraliberal Eduardo Paes deve ser total e irrestrito. No máximo, contando com um enrustido e envergonhado não-apoio por parte do PSOL, que, desde o fracasso histórico e sem precedentes do candidato Freixo em 2022, na prática, contabiliza votos para o gerente dos empresários. Do outro lado, provavelmente um candidato da extrema-direita, ainda mais fortalecida, e diante de um estado símbolo de uma república aos frangalhos e refém de uma burguesia cosmopolita entreguista. A FIRJAN, como não muito diferente das outras federações industriais, prefere, explicitamente, colher e exportar milho e soja ao invés de despontar um acordo sobre a indústria aeroespacial. Essa polarização, ao fim e ao cabo, oculta a centralidade da luta de classes na análise política e expressa o moralismo entre o identitarismo e os “bons costumes”, que só sequestram as atenções do povo em forma de oportunismo em nome do escamoteamento da real contradição entre as duas figuras: uma mera disputa de frações da burguesia.
O resultado, seja qual for, representa mais uma derrota histórica da classe trabalhadora carioca. O apoio dos amplos setores da esquerda eleitoral desnudam o farsesco conteúdo das últimas eleições presidenciais, que chegou a ser endossado por sindicatos, movimentos populares e estudantis: a conjuntura irá “mudar” com Lula. Em breve, o mesmo discurso será proferido para apoiar Eduardo Paes, uma figura que só encontra sustentação numa democracia puramente eleitoral, movida por discursos tecnocráticos e promessas vazias advindas dos velhos acordos com a iniciativa privada. O apoio a Paes, antes de significar a própria permanência das principais contradições da conjuntura, expressa a nova prática política da esquerda liberal, preenchendo seu conteúdo com as mesmas ilusões e promessas das privatizações da direita. Enquanto as massas apenas assistem a esse processo político, alianças ainda mais rebaixadas são necessárias para sustentação da esquerda liberal, que só gera perdas irreparáveis para a organização política e conscientização de classe.
A bala perdida que perfura a esquerda carioca vem do fuzil que a mesma entregou em cada concessão de temas estratégicos para a capital, para o estado e para o país. Enquanto a raiz da república rentista, deitada no endividamento do Estado pelo assalto dos mega-empresários, não for questionada, não haverá segurança, saúde ou transporte. Um mandato de prefeito, como de vereador, não resolverá os problemas que atingem a classe trabalhadora e, sim, devem organizar sua rebeldia contra a dependência, não se iludindo com as eleições. O horizonte da Revolução Brasileira RJ é a disputa pelo socialismo, empunhando bandeiras estratégicas para o estado, mesmo sabendo que as reformas, em última análise, só se consolidarão pela radicalização das massas em prol do projeto revolucionário.
André Oliveira
Militante pela Revolução Brasileira – RJ
Não sei que nome dar, mas a chamada esquerda liberal não tem absolutamente nada de esquerda. Precisamos refazer o conceito de esquerda.
antigamente chamavam de esquerda festiva. acredito que seja a atual liberal.