Amazônia em chamas: um chamado à Revolução Brasileira

Amazônia em chamas:  um chamado à Revolução Brasileira

 

   Os primeiros ciclos econômicos de exploração da floresta amazônica remontam ao século XVIII. Os jesuítas exploraram a região e o conhecimento indígena, e comercializaram o primeiro medicamento brasileiro, o Triaga Brasilica, um composto com 27 ervas e minerais importado daqui por portugueses e espanhóis. Os jesuítas foram expulsos pelo Marquês de Pombal e sumiram com a fórmula do remédio. Ainda na era pombalina a floresta conheceu os ciclos extrativistas do urucum, das pimentas e do cacau. No século XIX, a extração de gordura dos ovos de tartaruga nas décadas de 1840 e 1850 nas regiões de Santarém e do Rio Negro conseguiu esgotar a disponibilidade da espécie em escala comercial.

 

   Até então, os ciclos comerciais se davam nos eixos fluviais dos afluentes do rio Amazonas. No final do século XIX vimos os ciclos se expandirem para fora dos eixos tradicionais  com o ciclo da borracha, que teve seu auge entre 1879 e 1912, e uma sobrevida entre 1942 e 1945, durante a Segunda Guerra Mundial.

 

   Mas é a partir do golpe militar de 1964 que a Amazônia sofre o mais alto impacto. A descoberta das grandes reservas minerais na região, a valorização econômica da pecuária e do extrativismo da madeira, associados aos incentivos do governo federal, abriram espaço para que grandes projetos minerais e agropecuários fossem implantados sob o lema de “Integrar para não entregar”. Iniciam os ciclos do ouro – quem não lembra de Serra Pelada? Do manganês, que transformou a Serra do Navio num buraco. E Carajás, que segue sendo a maior mina de ferro do planeta, donde se extrai a cada ano mais de 70 milhões de toneladas do melhor minério de ferro do mundo, usado por exemplo, na construção do túnel sob o Canal da Mancha.

 

   Também foram implementados grandes projetos de colonização e reforma agrária na região sob o lema “colonizar a Amazônia pela pata do boi”. Segundo o senso agropecuário de 2018 do IBGE o rebanho bovino brasileiro no período de 1975 a 2017 passou de 101.673.753 para 171.858.168 animais, um crescimento de 69% em 42 anos. No mesmo período, o rebanho na Amazônia passou de 5.119.585 para 59.682.788 animais, um crescimento de 1.066%. Essa expansão pecuária ocorre simultânea e proporcionalmente ao ciclo de derrubada da floresta para a formação de pastagens, iniciando o desmatamento intensivo, incluindo áreas de seringais e castanheiras que eram utilizadas como fonte de renda das populações locais.

 

   É isso, três cabeças de boi para cada habitante da amazônia. Num país atravessado pela fome e a miséria. A maioria não come carne, ou come de vez em quando, não por opção, mas pela mais absoluta falta de recursos. O Brasil segue sendo o maior exportador mundial também de carne bovina e abrindo mão de 10 mil anos da maravilhosa cultura da floresta tropical pela monotonia triste e injusta dos pastos queimados e suas enormes castanheiras mortas. Na copa de uma castanheira, que atinge 55 metros de altura, tem-se a sensação de estar no alto de um edifício de 20 metros de altura. Uma única castanheira pesa mais de 70 toneladas, conquistadas em 600 anos de vida, abrigando 50 espécies de plantas e 1.700 espécies de invertebrados. Dez bilhões de árvores fazem da Amazônia a mais desconhecida e complexa teia da vida no planeta. A ganância cega da elite latifundiária põe boi pastando no seu lugar.

 

   Até 1964 menos de 1% da cobertura vegetal da amazônia havia sido alterada. Nos últimos 20 anos a média anual de desmatamento segue o ritmo da expansão da fronteira agrícola, apresenta queda em 2012, quando da apresentação do novo Código Florestal e volta ter oscilação crescente

 

 (Fig. 1) Desmatamento anual na Amazônia Legal (km2) (a) média entre 1977 e 1988, (b) média entre 1993 e 1994, (e) início PPCDAm. Dados do INPE.

 

   O Código Florestal de 2012 procura aliar os interesses do setor agropecuário – que teve seu revés com a queda dos preços das “commodities” – e as metas de preservação ambiental estabelecidas pelos acordos do clima a partir da ECO-92 em sucessivos encontros onde muito se fala e muito pouco se resolve, haja vista a efetividade dos acordos.

 

   Sim, a pecuária extensiva é responsável por grande parte da destruição da floresta. Os veganistas têm razão, e sua escolha não deixa de ser sensata, embora seja inócua enquanto a oportunidade de escolha não for de todos. Aos veganistas, a má notícia: mesmo que todos os brasileiros num passe de mágica ou por decreto deixassem de comer carne, a produção seguiria seu curso. Enquanto houver um bilhão de chineses, por exemplo, dispostos a provar a iguaria.

 

   Segundo o “novo” código florestal,  em área de floresta na amazônia deve ser mantida 80% da área como reserva legal (RL).  As áreas de RL podem ser exploradas economicamente mediante projeto de manejo florestal sustentável. Além disso, existem as áreas de preservação permanente (APP) que são áreas de vegetação nas bordas dos rios (mata ciliar) e ao redor das nascentes, nas quais nenhuma atividade econômica pode ser desenvolvida. Esta é uma visão simplória do código, já que existem inúmeras “exceções” na lei, especialmente em relação às APPs.

 

   Auxiliar ao Código Florestal, o Cadastro Ambiental Rural – CAR é um registro informatizado dos dados gerais das propriedades (fazendas, sítios, posses, etc), com registro e dados da localização da propriedade por coordenadas geográficas, o que facilita a detecção por satélite das áreas desmatadas e identificação dos culpados. Este fato já vinha ocorrendo na região sul do Pará, onde o desmatamento é detectado por foto anual comparativa do satélite e, pelas coordenadas geográficas, é identificada a fazenda/proprietário. Através desses dados o IBAMA e Ministério Público enviam aos frigoríficos da região ordem judicial proibindo o abate de animais da fazenda infratora até que a multa gerada pelo desmatamento seja paga. Esse monitoramento é realizado pelo Ministério Público Federal (MPF), através do projeto amazoniaprotege, disponível em: www.amazoniaprotege.mpf.mp.br.

 

   Pois o “dia do fogo”, iniciado em 10 de agosto de 2019,  foi declarado por fazendeiros paraenses mais exatamente no sudoeste do estado, que em publicação num jornal local declararam o “evento” como “apoio” ao governo do presidente Jair Bolsonaro.

 

   As queimadas iniciadas em agosto foram previstas em abril, pelos sistemas de geoprocessamento que apontaram um crescimento vertiginoso do desmatamento principalmente nos estados do Mato Grosso, Rondônia, Roraima e Pará, que costuma ser feito com “correntão”. A floresta derrubada fica exposta por quatro meses para secagem e então inicia o período das queimadas.

 

   Apenas como exercício, considerando que atualmente na Amazônia a pecuária está sendo desenvolvida principalmente em área de floresta, onde deve ser preservado 80% como RL, fica a pergunta: é possível manter o crescimento do rebanho em somente 20% da área?

 

    A área atual de pastagem na Amazônia é de 59.682.788 ha e o rebanho de 53.233.397 cabeças, a capacidade suporte da pastagem atual é de 1,4 UA/ha (IBGE, 2018). Considerando esses dados, significa que se fosse necessário se adequar ao novo código, os pecuaristas teriam disponível 11.936.557 ha de pastagem, onde deveriam elevar a capacidade suporte para 4,5 animais/ha. Portanto, respondendo a pergunta acima, podemos dizer que do ponto de vista técnico é totalmente factível o cumprimento do novo código, pois já existe conhecimento necessário para elevar a produtividade do rebanho a esse patamar.

 

   Num mundo onde o comércio internacional se dá cada dia mais com imposições de metas de sustentabilidade, o que vem levando os agropecuaristas e outros extrativistas da amazônia a desafiarem os acordos internacionais, provocando um aumento das queimadas em 70% em relação aos últimos três anos, expondo ao mundo mais de 32 mil focos de incêndio?

 

   Uma parte da resposta pode estar no depoimento de um “matador” ao jornalista Araquém Alcântara, autor da foto do tamanduá cego que foge da queimada. A foto deu a volta ao mundo na onda de comoção midiática pela amazônia:

 

“Aqui, seu moço, homem não tem palavra, mulher não tem honra,

terra não tem dono e árvore não tem raíz”

 

    A frase confessional foi dita no dia seguinte à captura da imagem, numa das inúmeras viagens de Araquém à Amazônia. Foi publicada em 2005. A condição do povo amazônida segue igual. Dos 20 milhões de habitantes da região, cerca de 25 mil fazendeiros possuem médias e grandes propriedades. Os indígenas somam 210 mil indivíduos. Mais de 400 mil proprietários de terra são pequenos produtores, existem cerca de 6 mil serrarias predatórias, uns 100 ou 200 mil garimpeiros, mais de 7 milhões de campesinos sem propriedade, outros tantos ribeirinhos e caboclos que se somam à população de trabalhadores urbanos que, como no restante do país, se amontoam nas periferias das grandes cidades.

 

   É preciso um modelo de produção que atenda a todos e permita não apenas que a floresta continue em pé, mas que tenha chance de regenerar suas muitas partes.

 

   São mais de 5 milhões de quilômetros quadrados. E não restam dúvidas que os territórios indígenas são os que sofreram menos degradação nestes últimos 50 anos. Talvez possamos aprender com esse povo que já foi maioria, que sofreu massacres, catequese, escravidão, fugas, muitos se adaptaram e mesclaram ao povo brasileiro e continuaram existindo e mantendo a pertinência. Como disse Darcy Ribeiro, seu crescimento demográfico é uma teimosia. Resistem sem submissão. Preservam sua cultura, seus modos de vida, sua visão de mundo.

 

   Exatamente o que nos falta para rompermos as correntes da submissão ao poderio estadunidense. Dar um basta à política sociocultural e econômica imposta pelos Estados Unidos desde 1823 e que até então nenhum dirigente político deste país ousou desafiar, culminando com esse acadelamento bolsonarista.

 

 

Muito além das queimadas

   Até aqui, tudo que foi exposto está na aparência do fenômeno. É preciso enxergar além das aparências.

 

A ideologia dominante nos últimos duzentos anos inoculou em todas as esferas da cultura a ilusão de que os recursos não renováveis – fósseis e minerais – seriam inesgotáveis, infinitos, eternos, assim como o homem contemporâneo não acreditou que o ar e o mar pudessem ser poluídos. Essa ideologia dos combustíveis fósseis dominantes justificou o esbanjamento afluente dos países colonialistas do hemisfério norte na etapa financeira do imperialismo, cujo berço é a matriz anglo-saxônica. Convém não esquecer que, no final do século XVIII, Londres produzia uma névoa que interceptava a luz do sol e arrebentava os pulmões de seus habitantes.”  Gilberto Vasconcellos em Biomassa – a eterna energia do futuro, São Paulo, 2002.

 

   O Brasil é o maior país tropical do mundo e os trópicos possuem a fonte de energia eterna, limpa e ecológica que vai impulsionar o desenvolvimento das forças produtivas do mundo inteiro quando findar a era dos combustíveis fósseis: a biomassa.

 

   E a Amazônia é a joia da coroa: a floresta guarda a maior biodiversidade do planeta e riquezas minerais incalculáveis, da água ao ouro.

 

   O poeta Thiago de Mello afirma que a floresta é a derradeira reserva genética da terra e denuncia a expropriação dos princípios ativos da ancestral medicina indígena, patenteados pela indústria farmacêutica imperialista: quem não sabe que todas as patentes de copaíba e andiroba, por exemplo, são estrangeiras?  O geógrafo ambientalista Aziz Ab’Saber, que foi consultor ambiental lulista e morreu denunciando a decepção com o liberalismo petista e tecendo severas críticas aos mega projetos como a transposição do Rio São Francisco e a hidrelétrica de Belo Monte, que ao fim e ao cabo só favorecem os latifundiários de sempre, sedentos de água e lucros. Ab’Sáber nos lembra que “exportamos a matéria-prima em grosso e eles, por mil caminhos, tiram valor agregado.”

 

   Não é de hoje que interesses internacionais cobiçam o território amazônico. Basta olhar nosso mapa e veremos ingleses, franceses e holandeses assentados nos nacos de floresta tropical ao norte do país.

 

   Precisamos ter em conta que todos os governos que ocuparam a presidência do Brasil até então administraram os interesses corporativos do capitalismo. A floresta amazônica vem sendo monitorada desde 1988 com dados armazenados pelo PRODES, projeto que realiza o monitoramento por satélites do desmatamento por corte raso na Amazônia Legal. Foram os dados divulgados por este projeto que culminaram na demissão do físico Ricardo Galvão que presidia o INPE, Instituto Nacional Pesquisas Espaciais.

 

   O avanço do agronegócio e mineração sobre a floresta segue uma linha ascendente e constante até aqui. Entre os anos 2000 e 2017 foram devastados cerca de 400 mil km2  de mata nativa, território equivalente a mais de uma Alemanha. Novas tecnologias de monitoramento aeroespacial apontam um subdimensionamento da área de floresta em 15%  e  que as Unidades de Conservação perderam 20 mil km2 no período. São dados publicados pela revista Nature Sustainnability, segundo estudos de pesquisadores da Universidade de Oklahoma que contou com a participação de cientistas brasileiros ligados ao INPE. A pesquisa aponta também que houve um ganho de 21% de área reflorestada entre 2001 e 2013.

 

Dependência tecnológica e soberania nacional

   Todo monitoramento porém é feito com tecnologia estrangeira. Dependemos do aparato tecnológico produzido nos países centrais e o desenvolvimento destes sistemas vem apresentando discrepância nos dados obtidos com o passar dos anos, tornando os antigos sistemas obsoletos e nos obrigando a adquirir novos pacotes tecnológicos, graças a ausência completa de desenvolvimento científico nacional na área. Não possuímos nenhum satélite nacional, nem produzimos um mísero drone com tecnologia brasileira.

 

   Exatamente como ocorre na falácia do “agro pop, tech, tudo”. Todo ganho de produtividade alcançado pelo agronegócio está alicerçado na importação de insumos, desde as sementes transgênicas de milho e soja, as modernas colheitadeiras, drones, aviões, fertilizantes, até a vacina do gado é importada. Importamos tudo que possui valor agregado para, após 500 anos, continuarmos exportando produtos primários, nessa eterna corrente de subdesenvolvimento e dependência.

 

As autoridades de governo e os empresários locais parecem acreditar que os países podem prescindir de um compromisso mais firme com as atividades internas de geração e difusão do conhecimento, e que os mercados podem lidar de maneira adequada com as questões do acesso à tecnologia e ao know-how. A tecnologia é vista como um insumo facilmente obtenível no exterior, quando necessário, e, portanto, considera- se que os recursos locais não devem ser utilizados para financiar uma infraestrutura interna de ciência e tecnologia.” Jorge Katz em Reformas estruturais orientadas para o mercado, globalização e transformação dos sistemas de inovação latino-americanos, Rio de Janeiro, 2005

 

   O fato de nos encontrarmos inseridos em uma sociedade capitalista competitiva exige uma constante rotatividade de produtos, sendo que os países industriais, retentores de tecnologia avançada, além de gerar inovações e atualizações tecnológicas são ao mesmo tempo os fornecedores. Isso nos impinge um eterno círculo vicioso de dependência. Enquanto não tivermos domínio sobre a  tecnologia avançada da qual necessitamos, o Brasil ficará extremamente vulnerável a alterações da demanda, geradas no exterior por essas tecnologias, como ocorre hoje tanto com os sistemas de geoprocessamento quanto com a tecnologia agrícola que vem sustentando os ganhos de produtividade no campo. Fora  que importar tecnologia não é fácil nem barato.

 

   Rui Mauro Marini ensina que  o capitalismo como conhecemos se mantém, principalmente, devido à existência da relação de dependência existente, mutuamente, entre os países centrais e os periféricos, e a dependência tecnológica é determinante na manutenção de tal relação. As constantes atualizações e os massivos aportes em desenvolvimento científico tecnológico nos países centrais condicionam os países periféricos  a direcionar praticamente toda produção ao mercado externo ignorando, na maior parte do tempo, sua própria demanda interna e se submetendo às necessidades dos países centrais. Isso nos leva a importar constantemente, seja produtos manufaturados ou mesmo tecnologia, expandindo constantemente a dívida pública. Como diz o Nildo Ouriques: “exportamos soja para comprar celular chinês.” Belíssima troca.

 

A ameaça à soberania nacional

   A floresta Amazônica é um território de mais de 3 milhões de km2. Cerca de 20% desta área está em processo de regeneração, segundo dados de 2017. Fatores climáticos, como o El Niño, facilitam a propagação de queimadas, que são responsáveis por cerca de 70% do desmatamento e chegam a quadruplicar o avanço do fogo sobre a mata em anos de clima mais seco. E o desmatamento para extração seletiva de madeira reduzem a resistência à seca aumentando a devastação.

 

   No último ano, segundo o Sistema de Alerta de Desmatamento, SAD, a Amazônia perdeu 5 mil km2 de floresta nativa.

 

   Para forçar a intervenção estrangeira sobre o território nacional, o governo Bolsonaro vem contestando os dados científicos, declarando guerra aos interesses nacionais e abrindo o flanco para a intervenção gringa.

 

   Neste meio tempo, a ONU vem montando um arcabouço jurídico de leis internacionais que visam a intervenção das grandes potências em nosso território.

 

   O ‘dia do fogo’ e os discursos do governo federal têm o claro interesse de fundamentar essa intervenção. Evitá-la é uma tarefa que caberá tão somente a um governo revolucionário que ouse tocar nas questões que fundamentam essa internacionalização: a ‘falta’ de recursos públicos que permitem o definitivo controle nacional sobre a ocupação da floresta e o esclarecimento da população quanto aos interesses em jogo.

 

   Entendemos que  duas questões nacionais fundamentais estão inter-relacionadas: a primeira é a dívida dos estados com a União. O Sistema da Dívida Pública brasileira vem impondo a  redução do  investimento estatal em saúde, educação, segurança pública e também em proteção ambiental. O plano do ministro ultraliberal Paulo Guedes, este marionete do sistema financeiro mundial, é privatizar tudo e vender todas as empresas estatais na bacia das almas. O pontapé inicial do jogo liberal foi dado por Fernando Collor, seguiu avançando com Fernando Henrique, esteve em campo com Lula e Dilma, avançou um pouco mais com Temer e chega agora o ápice da partida com Bolsonaro. Recursos e empresas estratégicas foram privatizadas nesse ínterim de 30 anos: começando com a Vale do Rio Doce e Embratel – para citar apenas as duas mais importantes – no governo FHC, seguindo com a perda do monopólio estatal da Petrobrás durante os governos petistas até chegar no estertor bolsonarista, onde o plano é privatizar o que resta. Ontem foi o Correios.

 

   O outro e mais importante é o projeto de internacionalização imperialista da Amazônia. Poderíamos apontar outras datas históricas onde este projeto foi lançado, mas vamos  nos deter nos “avanços” mais recentes:  nos anos 90, quando acontece a conferência mundial sobre mudança climática, a ECO-92,  o presidente russo Gorbachev e Mitterrand da França afirmam publicamente que a Amazônia é um patrimônio mundial da humanidade. Enquanto isso, a mãe de todas as ONGs, esse aparato de hegemonia para a manutenção do imperialismo, que é a Organização das Nações Unidas, vem desenvolvendo um marco legal para amparar essa infâmia e consolidar a posse do território amazônico em benefício dos interesses transnacionais.

 

   O arcabouço jurídico prevê e dá salvaguardas à intervenção externa quando um país negligencia a proteção do meio ambiente, causando danos socioambientais às demais nações. Ninguém ocupa o cargo mais alto da nação sem saber disso. Bolsonaro sabe e mete fogo na floresta para atender estes interesses estrangeiros.

 

   O títere protofascista Bolsonaro é eleito com uma capa nacionalista, consegue enganar uma população ignorante, atravessada pela fome e miséria. Mas os grandes patrocinadores desta aventura ultraliberal, o capital financeiro, os bancos, o agronegócio, os grandes latifundiários, o que resta de capital industrial no país, os grandes comerciantes e os meios de comunicação dominante, que afiançaram esta aventura ultraliberal, todos sabemos que nunca foram nacionalistas, querem mais é garantir seus lucros e suas cidadanias europeias e estadunidense.  Sabiam e sabem muito bem onde estavam amarrando seus cavalos.

 

   Mais: para eles, o projeto de rendição nacional operado por Bolsonaro, o alinhamento bovino com os interesses estadunidenses, em nome da ‘segurança hemisférica’, é o plano sendo cumprido.
Vários presidentes de associações do agronegócio vem recorrendo aos jornais da burguesia afirmando que se opõem à negligência do meio ambiente operada pelo governo federal.
É apenas a aparência. Em essência, eles concordam com a rendição do território, desde que seus lucros sejam mantidos e o comércio com a Europa, China e Estados Unidos não seja afetado.
É um grande erro imaginar que há interesses conflitantes entre o governo protofascista de Bolsonaro e a velha oligarquia latifundiária.

 

A concentração da propriedade da terra

   Até 1966, a maior parte da população brasileira era considerada rural. Em 1967 a população urbana ultrapassa pela primeira vez a população rural no Brasil. Em pouco mais de 50 anos chegamos ao índice de de 90% da população em zonas urbanas, sendo que 60% deste contingente aglomera-se nas periferias das 26 maiores cidades. O que os pós-modernos vem chamando de ‘exilados do clima’, na periferia do capitalismo são, historicamente, os exilados da terra. Os escravizados/assalariados, os sem-propriedade, os indígenas, enfim, os pobres do mundo. E os superexplorados dos países periféricos são, historicamente, ‘exilados’ e não é o clima que os remove de seus lugares de origem: é o capitalismo!

 

   Dentro dos marcos do capitalismo jamais mudaremos esta condição, pois ela é condicionante da manutenção do sistema. É preciso superar este modo de produção vigente, construir uma sociedade pós-capitalista onde os interesses da maioria – os nossos interesses, os interesses da classe trabalhadora – sejam por fim atendidos. Nem todos os países centrais do sistema conseguiram estender o estado de bem estar social às suas populações. O fetiche bolsonarista pelo imperialismo ianque esconde o fato de que a maior potência econômica  do planeta, os Estados Unidos,  é também o oitavo país no ranking mundial que mede a qualidade de vida das populações, IDH – índice de desenvolvimento humano. O Brasil ocupou o 73º lugar em 2010. De lá para cá caímos para a 79º posição.

 

   Somos o maior país tropical do mundo, capaz de impulsionar o desenvolvimento da humanidade nas próximas décadas.

 

   O povo brasileiro, submetido à superexploração do trabalho, com jornadas extenuantes, cansado de tanta demagogia, submetido à manufaturação ideológica por todos os aparatos de hegemonia já criados para a manutenção desse sistema, deu um recado nas urnas a todos que têm o privilégio de reconhecer em Marx um avô: querem mudar tudo que está aí. E esta mudança só acontecerá quando superarmos nosso caráter de economia subdesenvolvida e dependente. Para isso é preciso uma revolução. Uma Revolução Brasileira. Uma Revolução Brasileira, Nacionalista e SOLcialista.

 

Texto* de Ivana Melo Jacques
Militante da Revolução Brasileira e Presidente do Psol – Balneário Camboriú – SC
*Os textos e artigos publicados pelos Militantes pela Revolução Brasileira não exprimem necessariamente opinião da Coordenação Nacional da Organização.

 

 

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Comentários

  1. Análise irretocável. Obrigado pela luta no front eco-social, tão tomado pelo liberalismo, Ivana.
    Fica faltando, no entanto, um apontamento para a teoria revolucionária que será o mapa desse caminho, pois fazer a revolução demandará mais do que chamar a ela. O que seria, está por ser descrito, me parece.

    1. Gracias, Junio.
      A teoria revolucionária latino-americana possui um grande acúmulo teórico, na sociologia e na economia. O liberalismo e principalmente o uspianismo cepalino, apenas fizeram o desfavor de negar o pensamento revolucionário latino-americano.
      A Escola da Biomassa, por exemplo, fundamenta a Teoria da Natureza Tropical. O colonialismo intelectual do ambientalismo apoiado nos verdes europeus nega a Teoria da Natureza Tropical e nem toma conhecimento da Teoria Marxista da Dependência. Esse é o mapa. Construir as bases da Revolução Brasileira estabelecendo a crítica contundente ao liberalismo, suas facetas popósmodernosas que não vão a lugar algum, em resumo: menos Michel Löwy e mais, muito mais, Gilberto Vasconcellos. Mais Marx e menos marxistas europeus que negam ou subestimam a ecologia de Marx, Engels, Lênin e Bukharin.
      A revolução é um processo. Está em curso e cabe a cada um de nós agir em consequência.
      Espero ter respondido. Grande abraço!

  2. É, hoje a história se repete, só que ao invés de jesuitas a colonização europeia acontece através das Ongs – Organizações “não” Governamental que na verdade representa seus respectivos governos na luta pelo poder geopolítico, patrocinadas também pelos maiores capitalistas do globo como os Rothschilds que já são donos da maior mineradora de diamantes do mundo em Rondônia de forma ilegal alem de outras jazidas e terras gigantescas comprardas desde 1911, por incrível que larece eles também são os maiores patrocinadores da Wwf, com bandeira asteada de proteção do meio ambiente, mas dominando e garipando ilegalmente reservas indígenas a mais de 20 anos com as maiores reservas de titânio e de urânio do mundo , já que o chefe é levado para Europa com relógio no pulso, falando em conferências enquanto seu povo não tem nem luz para ligarem um ventilador para dormir e comendo enlatados. E vocês ai, achando que estão lutando pelo ambiente, mas subliminalmente entregando as reservas indigenas e minerais, ordenhados pelo capitalismo europeu, lutando pelo poder do mercado capitalista da UE. Enquanto isso os confundidos com mente de 200 anos atrás em pleno século 21 querendo uma revolução nacionalista socialista, que, pelo que me lembre se assemelha muito a prática do partido nazista chamado: Partido Nacional Socialista dos Trabalhadore Alemães (ahh mas Hitler era de direita, vai estudar) Sim, ele era de direita, a esquerda quem usa qualquer método, nazista, fascista se for preciso, para o poder sobre o povo. Adormecidos, salvem-se para salva o mundo. Quem está doente não é o mundo e sim a humanidade. Despertem!

  3. Belíssimo texto, Ivana. Tive contato hoje com seus textos, a partir da sua entrevista com o genial Gilberto Felisberto Vasconcelos. Através dessa mesma entrevista conheci o trabalho de Ana Maria Primavesi, e estou bastante empolgado com o que li. Queria saber onde posso ter acesso a mais textos seus, Ivana Melo Jacques. Você reúne um grande poder de síntese teórica e força revolucionária, com as tintas do nosso povo. Parabéns

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